Meu nome é Gervázio Ferreira e vou narrar a história da minha última caminhada pela Terra. O foco do meu relato é demonstrar o quanto o conhecimento e a minha fé espírita, sem mudança e obras, de nada valem.
Nasci em um lar familiar espírita. Desde criança, conheci a literatura de Kardec e tantos outros. Minha família frequentava o centro pelo menos três vezes por semana, como bons servidores fiéis à doutrina e a Jesus.
Acompanhava meus pais em todos os encontros. Ouvia os evangelhos, participava, mesmo que à distância, dos trabalhos mediúnicos, e tudo isso aguçava muito minha curiosidade. Quando em casa, meus pais falavam sobre as experiências e a doutrina espírita, e eu me aproximava para entender e fazer perguntas. Eles adoravam.
Meu pai, por vezes, comentava: “Esse será um grande trabalhador da seara do Mestre”. Era notável minha curiosidade e conhecimento da doutrina, mesmo sendo tão jovem.
As pessoas no centro me consideravam um aprendiz, e todos me tratavam com muito carinho e amor, sempre recebendo orientações dos mais velhos. Eu sempre fui muito respeitoso com eles e com todos os frequentadores.
Servia água, orientava as pessoas, me comunicava com todos.
Os anos foram passando, e depois dos meus vinte anos, com tanto conhecimento e mediunidade ostensiva, passei a trabalhar efetivamente. Os mentores da casa me convidaram ao trabalho e me disseram que já era a hora.
Lembro-me como se fosse hoje: o mentor da casa se manifestou em um dos médiuns e se comunicou diretamente comigo, inclusive me chamando pelo meu nome. Disse que havia chegado a minha hora de compartilhar todo o meu conhecimento com as pessoas e que todos os espíritos que me acompanhavam nessa trajetória terrena já estavam ansiosos para iniciar os trabalhos mediúnicos.
Outra coisa importante que ele me disse e pediu que eu jamais esquecesse foi: “Meu filho, você será um porta-voz da espiritualidade. Através de você deverão fluir mensagens de consolo e edificação para os assistidos, mas jamais se esqueça de uma coisa: o primeiro que deve aprender com todo esse trabalho é você. Não se envaideça, não se perca na escuridão da ganância e do orgulho. Preste atenção a tudo que é transmitido por você e lute para compreender, assimilar e colocar em prática. A nossa felicidade está na sua lapidação moral e espiritual.”
Eu entendi a preocupação, mas tinha em mente que jamais me perderia, visto que vinha me preparando há muito tempo e estava ansioso para compartilhar tudo o que sabia e tudo o que fluiria com amor através de mim.
Os trabalhos começaram, e eu me dediquei ao máximo. Estudava e trabalhava fora do centro, mas em todos os trabalhos em que eu poderia estar presente, esse era o meu compromisso com disciplina.
Como um trabalhador assíduo, com uma mediunidade de comunicação e consolo assertiva, fui me destacando dentro do centro, e muitos assistidos passaram a me acompanhar. Nos dias em que eu estava trabalhando na casa, ela estava sempre cheia, e eu ficava muito feliz com isso.
Não fiquei vaidoso; estava, de fato, querendo servir e servir cada vez mais. Ajudei muitas pessoas, doei muito tempo da minha vida – meu bem mais precioso – para auxiliar a todos.
Ficava feliz com cada narrativa e retorno das pessoas dizendo que haviam se transformado por conta do meu auxílio. Que alegria e felicidade! Sempre fui muito humilde. Recebia a todos, abraçava, dava uma palavra amiga e positiva, tinha muito carinho por eles, e a reciprocidade era verdadeira. Eu sentia isso no abraço, no agradecimento e no olhar de cada um.
Meus mentores estavam muito felizes com a dedicação com a qual eu me empenhava em realizar o trabalho de caridade em prol do meu próximo. A casa foi enchendo, crescendo, recebendo doações generosas, e pudemos aumentar o nosso auxílio aos mais necessitados. A alegria de todos era imensa.
O tempo foi passando, a casa prosperando, o auxílio aparecendo, a espiritualidade trabalhando, e nós servindo com amor e fé. Nossos mais velhos, aqueles mais antigos da casa, que a constituíram e pavimentaram o caminho de luz para que nós pudéssemos caminhar, foram desencarnando.
Em certo momento, meus pais se tornaram responsáveis por aquele centro de luz e caridade. Desde então, passaram a me preparar para o serviço. Fui me aprimorando, aprendendo a administrar e cuidar de tudo o que havíamos construído. Eu não tinha tempo para mais nada; enquanto pude, trabalhei para prover o material e tive uma vida próspera. Tudo fluiu maravilhosamente bem, e todo o restante do meu tempo era dedicado ao centro.
Em pouco tempo, juntando dinheiro e mantendo minha vida e a dos meus pais confortável, não precisei mais trabalhar em busca do material. Estava tudo resolvido e bem planejado até o final da minha vida.
Enquanto tive tempo, providenciei muitas coisas boas para meus dedicados pais, que também dedicaram suas vidas ao centro e ao trabalho caritativo.
Quando meu pai desencarnou, de forma repentina e dormindo, eu já tinha cinquenta e cinco anos. Foi uma fase tranquila, tanto para ele, que partiu, quanto para mim e minha mãe, que continuamos a caminhada terrena. Ele já tinha setenta e cinco anos. Era ativo, mas havia chegado o seu momento. Seu propósito estava cumprido, e eu daria seguimento ao seu legado dali para frente; essa era minha promessa.
Minha mãe ainda viveu mais quinze anos ao meu lado. Com noventa anos, permaneceu ativa e lúcida, extremamente reconhecida e valorizada por todos que a conheciam. Dedicou sua vida à caridade e ao amor ao próximo.
Eu estava seguindo a mesma vida que eles. A única diferença é que eu não constituí família. Minha verdadeira família eram os trabalhadores e assistidos da nossa amada casa. Tudo se encaminhava para uma vida dedicada a cumprir propósito e missão. Meu alicerce eram meus pais que, com seus exemplos de amor e dedicação, moldaram meu espírito desde pequeno para que eu desse sequência a todo o nosso planejamento reencarnatório.
Diferentemente deles, eu só tinha um problema. Meu coração era carregado de amargura, ressentimentos, culpa e tantos outros sentimentos negativos e destrutivos ligados à falta de perdão.
Eu não comentava com nenhum encarnado, mas sempre que tinha possibilidade, questionava o motivo de ainda estar nutrindo esses sentimentos em meu coração. Eu não sabia o que havia se passado para que eu estivesse carregando esse fardo, mas não conseguia me livrar dele.
Eles sempre me respondiam que, na hora certa, eu saberia, mas que eu tinha que prestar atenção aos sinais, às mensagens que eu repassava, às comunicações mediúnicas que eu transmitia e, principalmente, às orientações que eu dava aos assistidos. Muitos carregavam os mesmos sentimentos e, após ouvirem minhas pregações, onde eu falava com amor sobre Jesus e seu evangelho de luz, despertavam espiritualmente e se livravam desse peso, passando a caminhar com mais leveza.
Eu sabia de tudo isso. Prestava atenção em tudo que eu dizia e repassava de conhecimento sobre o tema, mas não tinha forças para lutar contra algo que eu não conhecia a origem.
O tempo foi passando, e aquilo foi me consumindo. Era uma mescla de culpa, remorso e arrependimento. Chegou um determinado momento da minha vida, também aos setenta e cinco anos, em que eu não conseguia mais trabalhar no centro. Não tinha mais forças nem vontade de voltar a auxiliar.
Eu estava agora consumido pela culpa e pela raiva de mim mesmo. Não entendia como um homem como eu, tão amparado pela espiritualidade e reconhecido pelas pessoas, não conseguia transformar o meu coração e dissipar tantos sentimentos negativos e, principalmente, o peso da culpa. Eu falava, mas não praticava. Ao analisar minhas próprias atitudes e hipocrisia, perdi a vontade de orientar.
Como eu poderia ajudar as pessoas se eu não conseguia ajudar a mim mesmo? As comunicações foram cessando. Essa energia negativa criada por mim mesmo foi abrindo portas para perturbações e obsessores. Percebendo o assédio espiritual, tentava rogar a Deus e aos meus amigos espirituais por ajuda, mas não mudava meus pensamentos e não conseguia mais fechar as portas.
Isso os impedia de me auxiliar. Eu mesmo impedia o auxílio, pois minhas lamúrias e reclamações em relação a mim mesmo, me julgando com veemência e me considerando uma fraude, os alimentavam, dando-lhes cada vez mais força para me assediar.
Passei as chaves do centro, entreguei-o nas mãos de outra pessoa muito bem preparada por mim, e o trabalho continuou crescendo e prosperando. Pelo menos esse projeto eu não destruí, mas estava destruindo a mim mesmo.
No centro, eles realizavam vários trabalhos com a intenção de me ajudar, pois percebiam e sentiam a minha necessidade. Mas, envergonhado, nunca mais voltei lá e fechei as portas para os contatos e conversas edificantes que poderiam ter me ajudado.
Desencarnei de forma abrupta, sozinho em minha casa. Meu corpo ficou uns dois dias se decompondo, até que uma pessoa do centro teve a percepção e foi verificar como eu estava. Sentindo o mau cheiro já invadindo a rua, decidiu chamar auxílio policial e invadir a minha casa.
Meu corpo estava lá, no chão do banheiro, sem vida, após um mal súbito. O pior é que eu estava lá também, dentro da casa, perdido e desorientado. Não sabia o que fazer nem para onde ir. Os bons espíritos, inclusive meus pais, não conseguiam me acessar.
Eles estavam comigo, davam passes tranquilizantes, oravam constantemente, mas eu não os percebia. Nossa vibração era muito diferente. A minha estava muito baixa, tomada pela culpa e pelo remorso.
Assim que desencarnei, minha mente retomou minha verdadeira consciência espiritual, e eu me lembrei de tudo o que me fazia sentir daquele jeito. Eu havia feito mal a muitas pessoas em vidas anteriores, usando meus dons mediúnicos para enganar e me locupletar financeiramente. Tive muitas posses, muito dinheiro e vivi os prazeres mundanos e a luxúria às custas do sofrimento alheio.
Destruí minha família. Esposas e filhos do passado ainda me odiavam. As dores e os sofrimentos que causei em vidas anteriores ainda atormentavam o meu espírito. A culpa era avassaladora.
Decidi, junto aos meus guias e mentores espirituais, aqueles que me prepararam para o retorno, voltar novamente com meus dons mediúnicos aflorados e dedicar toda minha vida à caridade para com nossos semelhantes, reparando assim o mal com o bem. Mas isso não transmutou meus sentimentos, e eu ainda sofria muito por aqueles que fiz sofrer. Contudo, portador do véu do esquecimento enquanto encarnado, não sabia o motivo de tantos sentimentos corrosivos dentro de mim.
Meus mentores também, sabiamente, não poderiam me contar tudo isso. Tudo ao seu tempo. No meu momento de transição, eu voltaria a me lembrar de tudo e teria que ter a consciência tranquila para seguir em paz e com serenidade.
Porém, isso não aconteceu. Fiquei naquela casa por anos, protegido por aqueles que me amam, que não permitiam que outros espíritos tentassem me tirar dali para me fazer escravo.
Eu tinha uma proteção muito grande contra todo tipo de assédio externo. Fiz muitos inimigos ajudando, libertando e despertando a consciência das pessoas que me seguiam. Mas, felizmente, fiz muitos amigos, e todos, naquele momento, tentavam me ajudar.
Contra o que vinha de fora, eu estava protegido, mas não contra o que nutria dentro de mim. Eu não tinha forças, ficava revivendo cada tormento que causei, em ciclos sem fim de sofrimento e dor.
Que angústia, que amargura e dor eu sentia. Naquela casa, sozinho, revivendo tudo mentalmente, passei muitos anos. Tinha breves momentos de sanidade e despertar, mas não eram suficientes para que eu ficasse lúcido, elevasse minha vibração e pudesse ser amparado.
Contudo, em um certo dia, após tanta oração de todos e, principalmente, da minha mãe, algo inesperado aconteceu. Uma providência divina dos planos mais altos. Algum espírito de alta envergadura, extremamente iluminado e desperto, apareceu para me visitar. Ele chegou com tanta luz e amor que dissipou toda a energia negativa daquele lugar, energias que eu impregnava em tudo.
Sua presença era tão forte e marcante que, no mesmo instante, caí de joelhos à sua frente, instintivamente. Minha consciência retomou a normalidade e o equilíbrio na mesma hora. Eu não sei até hoje o que aquele ser fez, mas foi providencial.
Era tanta luz que eu não consigo descrever sua forma, mas consigo cravar que ele parecia um anjo. Ele, ainda em pé, pegou em minhas mãos, e eu senti um calor enorme, uma emoção indescritível. Sem dizer nada, ele me levantou e me abraçou, rompendo assim todas as barreiras impostas por mim mesmo. Sua energia adentrou o meu ser, silenciou meus pensamentos repetitivos e dissipou toda a energia e sentimento negativo.
Eu estava renovado e disposto. O trabalho dele foi rápido, mas extremamente eficaz. Não sei explicar o que ele fez, mas ele me curou. Que ser inexplicável e iluminado. Nunca havia sentido uma energia tão forte e reconfortante. Tanto amor, mas tanto amor.
Ele foi se afastando, a luz foi diminuindo. Eu só tive tempo de dizer “obrigado”. Quando ele sumiu, a luz se apagou, e eu percebi que ainda estava na minha casa da Terra. Fechei os olhos, elevei meus pensamentos, fiz uma oração do fundo do meu coração e agradeci a Deus por sua intervenção. No mesmo instante, passei a enxergar meus pais e tantos outros que ali estavam aguardando ansiosamente o meu momento, o meu despertar.
Fui abraçado por eles. O reencontro foi muito emocionante. Ainda presos ao abraço e cercados por muitos amigos cheios de amor e carinho, recebemos uma chuva de pétalas de luz, que nos banhava e nos agraciava. Que momento mágico. Eu renasci naquele momento.
Parti com eles, mas não sem antes me despedir da minha casa e do centro onde trabalhei por tantos anos. Estava acontecendo um trabalho de atendimento aos assistidos. Aproveitei o momento e, com a permissão do mentor da casa, dei o meu relato. Me apresentei e disse tudo o que havia passado, mais uma vez na intenção de auxiliar as pessoas em seu despertar.
A emoção tomou conta da casa, dos trabalhadores e de todos, encarnados e desencarnados, que estavam me ouvindo. Muitos, naquele momento, após o meu convite, resolveram também partir comigo, e acabei ajudando mais espíritos que ainda estavam perdidos.
Meu trabalho na espiritualidade só estava começando; até hoje continuo realizando-o. Nunca deixei de aprender e servir. Não sou mais consumido pela culpa, mas sou extremamente grato àquele ser que me despertou e me curou. Ainda busco o perdão de forma incessante daqueles que fiz sofrer, mas não tenho mais culpa no meu coração, pois eu me perdoei.
Decidi dar o meu relato a vocês para que entendam que o conhecimento e a fé, sem obras, de nada valem. Eu estava cumprindo minha missão, como muitos de vocês, trabalhadores da seara do Mestre Jesus, mas carregava dentro de mim sentimentos que, enquanto encarnado, eram inexplicáveis. Um vazio existencial que não consegui preencher com amor ao próximo e caridade, pois aquilo que me consumia era muito mais latente.
Não se permitam carregar suas dores, seus traumas, culpas e ressentimentos. Busquem auxílio. Conversem com os mais velhos e com aqueles em quem confiam. Roguem por intervenção divina para que sejam curados, e sigam o caminho do bem, pois esta é a única forma de quitar os nossos débitos. Eu tive dificuldades além da conta, mas isso é mais comum do que imaginam. Religiosos e praticantes do amor também sofrem na transição entre a vida e a morte. A questão não é só em relação ao bem que pratica, mas também ao que você elimina de negativo que está dentro de você. Pense nisso. Paz e luz.
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